Livros do Escritor

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sábado, 27 de setembro de 2025

A Nininha

 


Hoje a Nininha completou sessenta Invernos, nem todos se podem vangloriar de somar Primaveras, é o seu caso, rasteira, maldizente, sabuja, até de estatura não se distancia muito do chão, o focinho está a meio-caminho entre uma mulher-a-dias e uma freira arrependida, a indumentária também oferece o seu contributo para este quadro, mobiliza-se por sombras e esquinas, rasteira, maldizente, sabuja, volta e meia surge de bandolete, o que lhe confere um ar ainda mais rural, como se a massa grisalha, que lhe preenche o cocuruto, necessitasse de tal ornamento, encostou-se a um desses trabalhos estatais onde o único requisito exigido é: um perfeito analfabeto-funcional; embora, como é evidente, a Nininha some outras distintas aptidões: rasteira, maldizente e sabuja; apesar da sua estatura não se distanciar muito do chão, a Nininha julga-se mais esperta que os demais, coloca uma expressão de seriedade, quando em diálogo, no entanto, a um olhar mais atento, tudo se desmorona ao reparar naquele ridículo ornamento, pois, a bandolete, que lhe confere um ar ainda mais rural, quem pode levar a sério uma criatura assim? Se quiserem encontrar a Nininha, no seu local de trabalho, procurem pelas sombras e esquinas, rasteira, maldizente, sabuja, apesar de tudo, enterneceu-me o nome com que pretende ser reconhecida: Ni-ni-nha... Como uma habitante das trevas, cuja estatura não se distancia muito do chão, as acções nem se tentam a erguer, pretende ser chamada por tal diminutivo: Ni-ni-nha?! Certas figuras femininas, ao perceber-lhes a maternidade, o primeiro pensamento que me assalta é Como alguém foi capaz de a engravidar? Esta tétrica figura entra destacadíssima nesta minha categoria, de facto, Como alguém foi capaz de a engravidar? Bem diz o povo: Para cada panela, há sempre uma tampa; apesar de tudo, custa-me a acreditar que, no caso da Nininha, fosse assim tão peremptório, a menos que também somasse Invernos, não se distanciasse muito do chão, rasteiro, maldizente, sabujo, ou talvez uma noite de copos ou qualquer outro incidente, a não ser que se tivesse encantado por uma bandolete e uma apetência pela ruralidade, hoje a Nininha completou sessenta Invernos, que mais se pode narrar desta tétrica figura? É difícil, mobiliza-se por sombras e esquinas, rasteira, maldizente, sabuja, cumpre ordens, é o que se espera de uma analfabeta-funcional, se detecta uma possível ameaça, rasteira, maldizente e sabuja, nas costas, verte todo o fel ao seu alcance, sem dúvida, a única arte onde se destaca: a maledicência; pela frente, o sorriso apatetado de uma figura por demais ridícula, talvez o tempo já se tenha encarregado de colocar alguém, no caminho da Nininha, para ensiná-la que também a sua esperteza não se distancia do chão, caro leitor, asseguro-vos deste facto, embora me continue a enternecer o Ni-ni-nha... Como não? E aquela ridícula bandolete, digníssima de um qualquer documentário sobre a ruralidade, o focinho a meio-caminho entre uma mulher-a-dias e uma freira arrependida, os passos ligeiros e nervosos sob a luz, é compreensível para uma criatura que se mobiliza por sombras e esquinas...


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