Livros

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sábado, 28 de janeiro de 2023


 

... não olhas as coisas com a distância, o tempo, o que tínhamos, acredita, não sobrevivia ao desgaste dos dias, perder-se-ia em semanas, no máximo em um ou dois meses.

- És profeta?

- Não, sou mulher.

- Lembro-me tão bem, cheguei a escrever-te, espero que te lembres: “Prefiro perder-me por ti, do que perder-te de mim”…

in Deslumbramento

Vou comprar cigarros e já volto

 


É tão estranho. Não te chorei, foi-te chorando. Depois da tua partida, foi-me apresentada a tua ausência. E, como sempre acontece, fomo-nos, primeiramente, conhecendo e, no fim, por acaso, tornámo-nos boas amigas. O pior é os miúdos. Ainda por cima, em idades tão difíceis. Creio que não haja idades fáceis para se perceber que um rosto já olha noutra direcção. E quando tudo começou? Tudo se inicia quando dois olhares se demoram. Foi a irmã dele que nos apresentou, nem amigas éramos, apenas boas conhecidas, um dia, já nem me lembro do porquê, fui a casa dela, ele ia a sair, logo me senti devolvida à terra, nem era particularmente bonito, mas tinha qualquer coisa, confesso que, nessa altura, também andava em baixo, terminara um namoro de dois anos, tornara-se insustentável, mais do que uma vez, apanhara-o de volta dos pertences dos meus pais, ainda lhe apresentei uma opção, mas ele exercera a escolha há muito, eu entre o luto, da relação terminada, e o despeito, de ter sido trocada por um vício, a porta do esquecimento, soube, há umas semanas, que o apanharam, de madrugada, dentro de uma loja, denunciado pelos vizinhos que despertaram com aquele estilhaçar de vidros, a subtileza nunca fora o seu ponto forte, vendo bem, ele fazia-me rir, acho que, em verdade, nunca gostei dele, talvez fosse uma coisa da idade, agora, do segundo, e último, até hoje, a questão foi diferente, sim, porque tive uma educação conservadora, os meus pais sempre me disseram Nesta casa, só se entra até determinada hora. Depois, fecha-se a porta. A menina percebeu? Claro que percebia, limitava-me a um esforçado sorriso, a ver se direccionavam o diálogo rumo a outras paragens, de sombras cálidas e portas de província, quando me devolvi a mim mesma, estava no carro dele, a umas dezenas de metros de minha casa, estacionara, e isso não me havia escapado, no intervalo de candeeiros, um desses lugares vedados ao radar paterno, tínhamos ido ao cinema, não me lembro do filme, mas sei que me assustara, talvez pelo meu estado de espírito de então, vícios, os pertences dos meus pais cercados, portas para o esquecimento, tudo isso ainda me habitava o pensar, na vigília e nos sonhos de sabor a fel, mas sempre sonhos, e nessa travessia carecida de equilíbrios, os lábios dele aportam nos meus, como se uma numa sequência lógica de acontecimentos, talvez pela hora, pela noite, pelo frio do filme e o calor daquele beijo, não o repeli, nos filmes seguintes, desaguava sempre naquele intervalo de candeeiros, um desses lugares vedados ao radar paterno, os lábios faziam-se, agora, acompanhar de uma mão com uma aptidão inata para a exploração, com dotes de alpinista e, simultaneamente, de espeleologista, nesse ponto, soletrei-lhe respeito, afinal, em minha casa, só se entra até determinada hora. Depois, fecha-se a porta, mas tudo tem o seu tempo, e, na nossa margem, só naufraga o que as correntes da vida trazem, fomos um do outro, certa tarde, em casa dele, na altura, talvez pelo meu estado de espírito de então, vícios, os pertences dos meus pais cercados, portas para o esquecimento, tudo isso ainda me habitava o pensar, na vigília e nos sonhos de sabor a fel, mas sempre sonhos, não me apercebi que ele se virou logo, para o seu lado, e adormeceu, como fui eu a abraçá-lo, pareceu-me extremamente romântico dormirmos juntos, denotava sempre um grande respeito pelos meus pais e pelas horas da casa, sobretudo quando tinha os amigos à espera, seguiu-se o casamento, pouco depois, pediu-me para falar ao meu pai de uns fundos para montar negócio próprio, já me tinha dito que andava cansado do trabalho na fábrica, e as coisas com o patrão já não eram as mesmas, falava-se, amiúde, que a mulher do patrão gostava, quando a levavam a casa, que estacionassem no intervalo de candeeiros, um desses lugares vedados ao radar marital, o meu pai concordou, de imediato, afinal, era a pensar no meu futuro, e da filha que eu já esperava, talvez para não incomodar a minha espera, nesses meses, tornou-se frequente a saída com os amigos, eu compreendia, não tinha qualquer mal, talvez já celebrasse a filha, certo dia, insultou, e quase esmurrou, um cliente mais picuinhas, daí a um processo nem um passo foi, o negócio que o meu pai havia concordado, de imediato, afinal, era a pensar no meu futuro, no da filha que eu tinha e do filho que já esperava, diluíra-se, bateu à porta de outra fábrica, era um homem de fibra, não era de ficar parado, o meu pai relembrou-lhe outras regras lá de casa, como aquela do emprestar não é dar, eu novamente a balançar entre abismos, certa noite, ele Um dia destes saio porta fora. Estou farto de vocês todos, pensei que a frase lhe emergisse de um copo, tal o seu perfume, disseram-me mais tarde, que tinham visto, desde há uns meses, o carro dele estacionado, no intervalo de candeeiros, um desses lugares vedados ao radar conjugal, numa rua onde vivia uma recém-viúva, dizia-se que muito abastada, não sei, acredito que esteja quase a chegar, afinal, ainda não disse boa noite aos filhos, que, na diferença das idades, na diferença da compreensão, começam a divisar abismos e travessias, ainda esperei por muitas noites, até que compreendi, numa manhã, talvez pelo frio da hora, o nada que eu abraçara num sonho apenas meu.


Adeus, Shane


 

domingo, 22 de janeiro de 2023

Um suspiro é uma interrogação escondida atrás da porta


 

Sempre que chego à margem do passeio, a minha mão ergue-se em busca de uma mais alta, firme, segura, que me levava até ao outro lado, sem antes proclamar Temos sempre de olhar para um lado e para outro, só então atravessamos, a frase acompanhada de gestos largos e expressões de seriedade, eu, sempre que na margem de um passeio, receoso daquela seriedade, talvez me observasse cada movimento, para ver se eu olho para um lado e para outro, e só depois atravesso, todavia, hoje, apesar da teimosia em erguer a minha mão, antes de atravessar, já não encontro uma mais alta, firme, segura, embora a sinta num lugar de mim, e ouça as recomendações no ouvir de agora, havia uma rua da cidade, que atravessava no regresso a casa, que, apesar da mão, das recomendações, o meu olhar já me esperava na margem oposta, no frio, na forma de castanhas, no calor, em gelados, quando ali desaguava, insistia com a mão mais alta, firme, segura, ou por aquele calor numa estranha forma de fruta que, por instantes, diluía frios e guarda-chuvas, ou por aquele doce arrepio que amenizava o sol de qualquer hora, regra geral, a mão cedia, mas havia, como sempre há, mais qualquer coisa, recebia-nos um casal com a genealogia da humildade, só quem vive do sal do rosto tem tal ascendência, de vez em quando, a filha, mais velha que eu uns anos, ajudava-os, apesar da genealogia, no seu rosto havia mais uma parcela somada, afigurava-se-me como uma realeza calada, qualquer coisa assim, uma altivez sem vertigem, muitas vezes, a mão a estender-me o canudo das castanhas e eu perdido naquele rosto, naquela dignidade com que apanhava os cabelos, a elegância que as páginas amarelas ganhavam nas suas mãos, folhas que se metamorfoseavam em canudos, como se sempre no mundo com aquela forma, apenas aguardavam um despertar, raras vezes os nossos olhares se cumprimentaram, talvez eu, em verdade, nunca tenha atravessado até à sua margem, reparei que, sempre que os céus resolviam lavar a terra, o seu olhar erguia-se até a um indefinível das alturas (Em prece? Súplica? Gratidão?), nunca soube o porquê, ou talvez não o quisesse compreender, é o que sucede mais vezes, na altura dos gelados, era comum vê-la com as cores dos sonhos nas mãos, como se um diálogo de iguais, era a florista, tinha a banca uns quarenta metros de passeio mais abaixo, que lhe dava, achava-a triste, dizia, os pais encolhiam os ombros, na certeza do desconhecimento, uma tarde, naquela rua da cidade, que atravessava no regresso a casa, ela não estava, a mão caminhou por um canudo de páginas amarelas, eu hesitante em segui-la, deixei de sentir frio, pelo menos de fora, por dentro chuvia, o casal com a genealogia da humildade recebeu-nos como sempre, mas o canudo com os frutos do Outono afigurou-se-me tosco e um espelho do céu, desejei, lembro-me bem, nesse momento, que os céus lavassem a terra, compreendi, numa esquina de mim, que ela não ia regressar àquela margem de passeio, por um lado, congratulei-me, afinal, ela olhava o indefinível das alturas, por outro, perdi a vontade de atravessar aquela rua da cidade, em cada regresso a casa, neste ponto, só posso agradecer à mão pela sua firmeza, hoje, perdi-me num oceano de travessias, e procuro encontrar aquele que os outros não quiseram conhecer, porque sempre quiseram que eu fosse, apenas, um já conhecido deles, e nessa minha busca regresso à margem de um passeio, ergo a minha mão, antes de atravessar, para uma mão mais alta, firme, segura, que só eu sei ali presente, ouço-lhe a voz Temos sempre de olhar para um lado e para outro, só então atravessamos, chegado ao outro lado, onde antes, um pouco de passeio, no frio, em forma de castanhas, no calor, em gelados, agora apenas mais um vazio, povoado de sombras caminhantes, ergo o olhar a um indefinível das alturas (Em prece? Súplica? Gratidão?), talvez àquele ponto em que as cores dos sonhos cabem na palma de uma mão.

domingo, 15 de janeiro de 2023


... ainda ontem, ao telefone, falava-lhe de natais por nascer e de aniversários por cumprir, os braços lívidos ajudaram-no a pousar o telefone, percebeu-lhes a dificuldade, afinal, ninguém ilumina um universo para assistir ao seu sono.

in Os anjos não caminham

quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

Hoje refaço dezoito anos

 


Conheci-o há uns largos meses. Bom, é melhor ser mais específica e iniciar este relato convenientemente. Há um quiosque, em frente ao meu prédio, do outro lado da rua, onde me abasteço, há anos suficientes para já não saber desde quando, de revistas e jornais. Mais revistas, confesso, para desgraças já me chega a vida. Moro num primeiro-andar, um humilde apartamentozito, embora com uma renda bem estridente, na companhia do meu gato Popov, e de um periquito, que nunca baptizei, não sei porquê, mas com o gato ainda converso, sobretudo naquelas noites em que o vento ressoa lá fora, e eu para ali, balizada entre o sofá e a novela, ele ao meu colo, de vez em quando levanta-me o olhar, como se me dissesse Está tudo bem, afinal, é o meu único calor, e o vento, lá fora, a amainar, mas regresso ao quiosque, onde me abasteço, há anos suficientes para já não saber desde quando, de revistas e jornais, sempre ali encontrei o rosto do senhor Ramiro, é curioso, nunca me pareceu alterar-se, como se mantivesse a mesma idade desde que o conheci, ou seja, para mim, sempre foi velho, e com o passar dos anos, as pessoas da idade dele como que estacionam e aguardam a nossa chegada, e só aí é que reparamos naquela coisa chamada tempo, não era muito simpático, também nunca conheci um vendedor de revistas e jornais rico em simpatia, contudo, mal me via a atravessar a estrada em sua direcção, providenciava a minha revista preferida e, no caso de haver brinde, tinha-o cuidadosamente guardado, uma vez foi um saco-praia, outra um elegante guarda-chuva, da janela, o Popov seguia os meus passos num zelo fraterno, entredentes o senhor Ramiro praguejava sempre qualquer coisa, ora contra os recorrentes desgovernos do rectângulo, ora contra o fado do seu existir, ora contra o calor demasiado ou a chuva inclemente, mas sempre aquele ruminar imperceptível, por vezes apanhava-se fragmentos que possibilitavam o contexto, como se entoasse uma melodia consentânea com as cores do seu sentir, mas num Domingo, só depois de atravessar a rua, a uns passos do quiosque, após recontar as moedas, na palma da minha mão, necessárias para a revista, compreendo que um outro rosto me aguarda, impassível, sem melodias ruminadas, nem gestos de me colocar, de antemão, a minha revista preferida num saco branco amarfanhado, mais novo, olho à minha volta, alimentada pela incredulidade, para comprovar se não me enganei no destino, de facto, não, os meus passos, agora, renitentes, o rosto impassível lê-me as hesitações, lança-me uma ponte sob a forma de um airoso cumprimento, quando regresso à minha circunstância, compreendo que é o filho mais velho do senhor Ramiro, está ali a substituí-lo enquanto prevalecer o seu internamento, o coração cansou-se de tanto se entristecer com aquelas melodias, encontraram-no caído à entrada do prédio, uma sorte alguém ir a sair naquela altura, o negócio não podia continuar fechado, ainda por cima, aquele filho sem trabalho, a empresa ligada aos computadores falira, e eu sempre ouvira dizer que o futuro está na informática, cada vez percebo menos o mundo, acompanhei a evolução da convalescença do senhor Ramiro pelo filho, sempre que atravesso a rua, agora, sou recebida com aquele airoso cumprimento, em vez de se preocupar com a minha revista preferida num saco branco amarfanhado, a sua atenção em mim, nos meus interesses, naquelas coisas que ninguém me pergunta, os cotovelos sobre cabeçalhos e o rosto a um palmo do meu, gosto daquele seu olhar, parece que tudo à minha volta emudece, faz-me sentir o centro, antes dele, ninguém me fez sentir assim, minto, talvez o Popov, daí àquele café perto do cruzamento foram duas revistas e dois sacos brancos amarfanhados, tudo nele serenidade, e eu tão cansada da solidão deste mar-alto, resolvo aportar, uma noite convido-o para jantar, aparece-me à hora marcada de ramo de flores na mão, ao princípio, fiquei perplexa a contemplar aquelas cores harmoniosas (há quanto não me ofereciam aquela natureza materna?), sempre de gestos contidos, o único excesso da noite proveio de Popov que abandonou a sala de um salto assim que o convidei a entrar, ajudou-me com tudo, pratos, toalha de mesa, talheres, de novo, tudo emudecia à minha volta, ao despedir-se, os seus lábios entre a minha face e um canto dos meus, não sei se de propósito, se por acaso, mas soube-me a céu, uma vizinha, mais tarde, disse-me que ele tinha duas filhas, uma quase adolescente, fruto de uma relação de vozes sobrepostas, entretanto terminada, confesso que tive de me equilibrar perante aqueles golpes do verbo, procurei disfarçá-lo sob o  seu olhar arguto, nessa noite, quando a campainha tocou, ainda não decidira que caminho tomar, em verdade, se nunca lhe perguntara o passado e o presente, ele não me escondera nada, e eu tão cansada de mar-alto, a descansar agora naquele porto de águas serenas, hoje a surgir-me com as cores quentes de uma caixa de chocolates, a sentar-se a meu lado, no sofá, Popov entretanto regressara, mas para o seu colo, de vez em quando, a sua voz rouca e serena segreda-me Está tudo bem, e o vento, lá fora, a amainar, pode ser que, um dia destes, me ajude a baptizar o periquito…

sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

Os anjos não caminham


 

Caminhava atrás daquela figura de branco (ou seria de negro?), sem perceber quem lhe ordenava os passos, por aqueles longos corredores, que se lhe afiguravam ainda mais obscuros, ela a ordenar-lhe que se sentasse, ele numa obediência infantil, pelo menos da infância que foi sua, a figura de branco (ou seria de negro?) ressurge, segura, numa mão, um copo de plástico com água, na outra, um pequeno cilindro colorido, diz-lhe, num tom doce, compreensivo, mas, simultaneamente, sem espaço para réplicas, é curioso como uma frase, em certas vozes, possui uma miríade de significações, Tome. Engula de uma só vez, cumpre com o imperativo, Vai ser melhor para si, e para os seus, vai ver. Daqui a uns minutos, venho buscá-lo, deixa-se estar, ali sentado, a olhar, não a parede em frente, que tinha um panfleto qualquer suspenso a fita-cola, talvez a chamar a atenção para a relevância da higiene oral, sombras de pensamentos, ou de sentires, uma indolência ganhava terreno nas suas raízes, olhava, agora, à volta, com o sentir já morno, de repente, uma mão no seu ombro, nem se apercebeu dos passos que a trouxeram, de novo, a voz doce, compreensiva, mas, simultaneamente, sem espaço para réplicas, Está mais calmo? Venha, então, levantou-se com alguma dificuldade, a dado momento, teve de se apoiar no encosto da cadeira, Quer ajuda? Tem a certeza? Recusou duas vezes, sublinhadas com uma horizontalidade em movimento, embora lenta, afinal, uma mão ainda se firmava no encosto da cadeira, por fim, seguiu-a, ao entrar no quarto, cuja penumbra apenas se atenuava por uma luz esbranquiçada proveniente da cabeceira da cama, viu dois braços lívidos que seguravam o universo, agora em repouso, olhou a figura de branco a seu lado (ou seria de negro?), em gratidão pelo cilindro colorido, só assim ali chegara, os braços lívidos levantam um rosto à altura do seu olhar, como é estranho, não havia nele arqueologia de traços salgados, mágoa, revolta, apenas uma dor demasiado subterrânea para ser traduzida em feições, senta-se, na cama, ao lado daquele amplexo, os braços lívidos já baixaram o olhar, contemplam, de novo, aquele universo em repouso, ele relembra o dia em que ali entraram, pela primeira vez, norteados pela angústia em forma de dúvida, embora, entre eles, saltitasse um universo de esperança, tiveram de regressar, e regressar, viram majestades destituídas da sua coroa, mas nunca dos seus sorrisos, mesmo quando os rostos amareleciam, havia aquela dignidade prevalecente, como se a coroa tivesse mudado de lugar, parece que há lugares, neste mundo, que se nos colam à pele, este é um deles, quando ali não estavam, o seu pensar deambulava por aqueles longos e obscuros corredores, com o tempo, o sorriso foi estreitando enquanto os braços empalideciam, aquela vozita filha da espontaneidade foi ficando arrastada, curioso, nunca quis nada que lhe ocultasse o roubo da coroa, apenas uma frase para atenuar o efeito, Assim pareço o Avô, talvez compreendesse que há vazios intangíveis, talvez por gritarem para além da rouquidão, ainda ontem, ao telefone, falava-lhe de natais por nascer e de aniversários por cumprir, os braços lívidos ajudaram-no a pousar o telefone, percebeu-lhes a dificuldade, afinal, ninguém ilumina um universo para assistir ao seu sono.