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quinta-feira, 13 de janeiro de 2022

 


No final silêncio da noite, ouço gritos em mim



Que horas são? Há quem lhe chame tarde. Porquê, pensava ele, se talvez ainda lhe fosse cedo. A seu lado, o banalizado aparelho rectangular, assim que lhe toca, as luzes, embora nunca achasse a graça que outros lhe consagravam, ao ponto de toda uma nova mitologia, reconhecia-lhe, sim, apenas utilidade, com a dificuldade do novo, escrevinha qualquer coisa (Como estás?), e o botão do destino cumpre-se. A seguir, senta-se, e no horizonte a espera por uma esperança que se ilumine. Ainda demorou o tempo do muito pensar, até que Como queres que me sinta? A resposta tornada questão, uma estranha metamorfose, como se sem tempo para a pausada respiração da natureza. No fundo, a resposta não o surpreendeu. Só sucede quando se desconhece, por inteiro, o emissor. Que lhe podia dizer? Enquanto procurava articular palavras que possibilitassem uma frase, o sentir sempre longínquo do verbo, o polegar demasiado diminuto para o oceano que lhe oprimia o peito, ainda assim, o botão do destino a cumprir-se, enquanto se lhe dissipa do horizonte de um ecrã a frase Não sei. Apenas isso: Não sei. A ampulheta dera a volta, de novo, a espera em si. Entretanto, reanalisa a sua resposta, do ridículo ao profundo, observa-a com todas as roupagens. Mas como fugir-lhe? De facto, não sabia. Até que a luz Sabes bem o que eu desejava… Ele a compreender a distância de um desejo. Como é longa! O que responder à distância? Haverá alguma resposta? Talvez a mais simples, ou seja, a verdade na forma de um eco suspirado. E o desejo dela já viajante cansado, ele espreitava-o da janela, mas nunca descera para lhe abrir a porta, de novo o rectângulo em vida, Mas sempre o ignoraste! A perplexidade pela síntese temporal contida numa singela frase Mas sempre o ignoraste! Durante quanto tempo? O seu polegar, vagueando na indecisão, tacteia letras e números, como se uma extensão de um pensar cambaleante, por fim, decide-se pelas teclas mais próximas da sua verdade e articula o seguinte juízo Não me podes censurar. E acrescenta-lhe uma questão: Que podia eu fazer? De novo, silêncio, após a tecla emissora. Quanto tempo passou desde que…? Sempre demasiado. Agora, um silêncio de fim sobre as coisas. Ele ainda para ali, debruçado sobre aquele rectângulo, como se de uma balaustrada contemplasse a paisagem ida de si. Com o silêncio, as trevas de ecos da madrugada. Nem sono, nem cansaço, nem vida nele, apenas uma melancolia paralisante e um fascínio desesperançado por um ecrã agora apagado. De novo, o polegar, mais pausado, a falar por si Ainda aí estás? A espera por… A espera tem o rosto do desconhecido. E sempre desconhecemos este facto. Uma vez mais, a timidez de um som a sobressaltá-lo, Tu sabes o que podia ter sido diferente, após isto, o seu olhar a fechar-se, o passado (Recente? Longínquo?) timidamente a iluminar-se, com a cor escarlate do arrependimento, a impotência dolorosa pelo horizonte vislumbrado daquela balaustrada, de novo, um som tímido, Já é tarde. Talvez tenha sido sempre tarde. Ele a fechar a mão sobre o rectângulo, talvez com demasiada força, frases iniciadas por não esvoaçaram por si, mas o polegar imóvel. Pousou o rosto numa almofada, expirou o tempo suficiente para inspirar serenidade, o polegar Sim. Mas ainda aqui estou… O ecrã em luz e a tecla do destino cumpriu-se. Lá fora, ouviam-se os primeiros passos da manhã…


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