Livros do Escritor
domingo, 27 de setembro de 2020
sábado, 26 de setembro de 2020
segunda-feira, 21 de setembro de 2020
Almoinhas Velhas
sábado, 19 de setembro de 2020
terça-feira, 15 de setembro de 2020
domingo, 13 de setembro de 2020
Quando o Sentir não se traduz em Verbo
Hoje vi-o a descer a rua. Há muito que o não via. Está mais magro. Mantém aquele recente ar absorto, próprio de quem se sabe em palco. Sim, cada saída é sempre um levantar de cortina. E ele sabe-o. A vida, por vezes, impõe-nos isso. Não há como lhe fugir: um palco! Há quem defenda que a vida é, em si mesma, uma representação. Discordo. A vida é uma totalidade, por conseguinte requer palcos e camarins. Observei-o, no longe da discrição. Estava arranjado, claro, a cortina subira, devia ir às compras, mas o passo, sim, o passo, denotava uma qualquer hesitação, que talvez estivesse com o meu olhar, ou, de facto, naquela recente magreza. Lá ia, rua abaixo. Nada via, apenas interior de si. O que significa absorto? Apenas olhar-se… Quando me apercebi, a cortina descera. Não fui a tempo dos aplausos. Já tinha passado. E eu, preguiçoso, ainda sentado na plateia. Levanto-me. Resolvo descer aos camarins. Talvez ele esteja por lá. Procuro-o. Não o encontro, apenas rostos desconhecidos. Um constante acotovelar, talvez da exiguidade do espaço, talvez da pressa de uma aparência… Para quê? Neste teatro, nunca se ouviu falar em regressos. Sim, só há uma porta, em todo o edifício. Só se entra uma vez… E quem sai, deixa um inominável atrás de si. Um rosto, uma voz, um gesto, um sorriso, que habitam o espaço de uma memória, e entre o subir e o descer do pano, tudo se turva, e a memória cede lugar à dúvida, e a questão brota num lugar de nome: demografia das ausências. Era neste espaço que ele se movia. O lugar dos absortos, dos que receiam a dúvida.
Neste caso, não havia espaço para o duvidar. Eu também a conhecera. Era uma actriz de fortes convicções. Sempre que estivéramos em palco, trazia uma questão à mesa. Sempre actual e polémica. Assim, assegurava a atenção da extasiada plateia. E longos e obstinados debates se desenrolavam sob luzes e olhares. Mas, logo que a cortina descia, e recolhíamos aos camarins, a obstinada actriz cedia lugar a uma mulher de espontâneas generosidades. O equívoco de muita gente, nos seus julgamentos liminares, deve-se à luz do palco. A luz cega. Não só o artista, mas sobretudo o espectador. É preciso, muitas vezes, a luz mortiça dos bastidores para compreender egos idos e humildades chegadas. E, nesta incessante caminhada, no interior deste velho teatro, balizada entre palco e camarins, raras vezes na plateia, perdemos rostos. Saem, quase sempre, na discrição de um ocaso estival...
quinta-feira, 10 de setembro de 2020
Os Invisíveis
Ouviram um barulho pela casa, passos e simultaneamente algo a ser arrastado, entreolharam-se, mas podia ser numa casa vizinha, gradualmente os passos a aumentar, a aumentar, os arrastares também, agora vozes, eles (em que parte da casa estariam?) já em espanto, a sair do quarto, do cimo das escadas viam um entra e sai constante, sujeitos a levar móveis, sofás, quadros, objectos, tudo a ser-lhes retirado sem um aviso, uma palavra, nada, a incredulidade inicial deu lugar à indignação, desceram as escadas, entretanto, para aí a meio, um sujeito cruza-se com eles, subia em direcção ao quarto, parecia nem vê-los, como se não existissem, tal o foco do seu olhar no cimo das escadas, estranharam a ausência, pelo menos, de um cumprimento, a mais elementar prova de educação, foram perpassados por um frio profundo quando se cruzaram com o sujeito na escada, no piso térreo havia perto de uma dezena de desconhecidos a retirar tudo o que vissem da casa, estavam incrédulos (Mas o que é isto? O que se passa? Estamos a ser alvos de um assalto?) com os acontecimentos, tentaram articular frases, porém, a voz sumira-se, de novo, entreolharam-se, apenas gestos a exprimir a impossibilidade do verbo, ele sossegou-a e indicou-lhe para não sair de onde estava, avançou ao encontro daquele ininterrupto entra e sai da sua casa, todavia, ou ignoravam-no ou não o viam, ninguém parecia dar pela sua presença como há pouco sucedera na escada...
terça-feira, 8 de setembro de 2020
domingo, 6 de setembro de 2020
quinta-feira, 3 de setembro de 2020
Janela para a noite
As viagens que mais perduram em nós são as que não realizámos, há uma que não pára de ganhar espaço em mim, como se uma condenação, uma viagem rumo a Norte, creio que nenhuma outra terá a mesma relevância na minha biografia, até pelas linhas que já lhe dediquei, uma viagem por realizar, de facto, a mais duradoura, talvez o título mais apropriado para esta crónica fosse “Uma viagem por realizar”, sem dúvida, porém, optei por outro, e não por acaso, a melhor fase da minha vida foi quando senti o sabor da noite, há algo de transcendente nas coisas sob o manto nocturno, tudo surge sob uma outra claridade, que o dia ofusca pela inclemência da luz, basta reflectir que impossível é um dos vocábulos mais inusuais ao luar, afinal é quando se levantam os sonhos...